- A Paz Através de Uma Tigela de Chá -

Utilização de Diversos Materiais Naturais

Pelas excelentes técnicas dos artesãos, coisas da natureza como gramíneas e árvores renascem em esplêndidos produtos artesanais. No caso do Japão, há os de cascas de árvores, cana comum yoshi (pragmites), junco-solto (igusa) etc.

Como trabalho artesanal de casca de árvore de cerejeira, da variedade yamazakura, temos marmita (bentobako 弁当箱), recipiente para guardar chá (chazutsu 茶筒), espátula de chá (chabera 茶ベラ), bandeja (obon お盆). Também, estojo portátil de madeira para guardar tinta nanquim e pincel, persianas rolô de cana comum (yoshi), divisória móvel, teto com cobertura de yoshi. Além das esteiras (goza), tapetes e descanso de panelas tecidos com hastes secas de junco-solto. As tigelas eram escavadas na madeira, submetendo-se em seguida a uma cobertura de laca, e dizem que a laca urushi do Japão era chamada de “Japan”. A beleza artesanal do Japão está também no conjunto de peças laqueadas para refeições: a bandeja de comida (zen 膳), a jarra de água com asa, bico e tampa (yutô 湯桶), as tigelas laqueadas (urushiwan 漆椀). A casca de tartaruga e o marfim eram usados para fazer enfeites e grampos de cabelo, mas atualmente a importação é proibida sob o Tratado de Washington.

IMITAR A RECICLAGEM DE EDO

O período Edo no Japão (séc. XVII – séc. XIX) teve uma sociedade de reciclagem quase perfeita. A ideia de “valorizar as coisas e utilizá-las até o fim” foi bastante difundida. Ao contrário de hoje, em que se diz ser a cultura do descartável, a cidade de Edo parece que quase não gerava lixo. Se o utensílio se tornava velho ou quebrava-se, havia o artesão especialista em restaurações, para que ele continuasse a ser usado.

Para consertar panelas e caldeiras tinha o “ikakeya”; a cerâmica quebrada era colada e usada graças à técnica kintsugi 金つぎ (aplicação de verniz ou resina polvilhada com ouro) ou yakitsugi 焼きつぎ (aplicação de esmalte e queima novamente). O balde de madeira (atualmente a maioria são de plástico) era consertado no “tagaya”. A mó manual, a foice, a faca, o serrote e outros objetos cortantes eram amolados ou afiados por profissionais, para serem bem utilizados.

Além de manutenção, também há trabalhos para recuperar o objeto que se tornou inútil.

Papeis de janelas e portas corrediças, roupas velhas, os guarda-chuvas, tudo isso era reciclado. Por exemplo, colando aburagami, papel com aplicação de óleo impermeabilizante, consertava-se os guarda-chuvas. Saquê, shôyu, óleo eram colocados em barris e vendidos. Fazia-se permuta de coisas como vassouras de palmeira-moinho-de-vento (shurobôki シュロボウキ); cinzas geradas da queima de objetos eram aproveitadas como fertilizante; detergente, tingimento têxtil, cerâmica e até excremento humano eram negociados (este último, para ser usado como fertilizante orgânico). Pregos antigos e bordas de madeira e até mesmo restos de papel que caem na beira da estrada eram reciclados. A cidade de Edo era muito bonita e os estrangeiros que a visitaram no final do período Edo, surpreenderam-se com sua limpeza.

Vivendo só com a energia da natureza, como sol, água e vento, e com a matéria prima que se encontra no seio da própria natureza, ali podia-se experimentar verdadeira “riqueza espiritual”, algo um tanto diferente da atualidade.

 

Agosto de 2018